sábado, 6 de julho de 2013

Busca da Felicidade. - budismo




Busca da Felicidade.

Qual é o caminho que o budista deve percorrer para conquistar a felicidade incondicional, resultado da compaixão por todos os seres
e da libertação final de todo sofrimento?

O budismo não vê a existência do ser humano abaixo dos desígnios de divindades e nem a necessidade de se ter fé nelas. Sem dúvida, ele também é considerado uma religião, palavra que vem de religare ou seja, “voltar a unir o que está separado”.

 O budismo afirma ser um caminho para o completo despertar espiritual do ser humano, o que nos permite supor o entendimento de que não somos algo separado da natureza fundamental que está em todas as coisas.

Ele também requer fé, ainda que não em seres superiores, mas nos ensinamentos budistas, chamados de “dharma”. Do mesmo modo que, para fazermos uma viagem, precisamos acreditar que os mapas são corretos, é necessário que se tenha fé nos ensinamentos de Buda para seguir este caminho. A fé verdadeira em que todo ser humano tem capacidade para se converter em um Buda é um sinal de completo despertar espiritual.

Buda dizia que não dava por dogma nada sobre sua doutrina ou sua pessoa. Isso significa que a fé da qual se fala no budismo não é cega, mas baseada na própria crítica pessoal, na experiência do que já foi vivido e na capacidade de indagação.


O budismo não é, tampouco, um caminho de conceitos ou leituras para se obter conclusões razoáveis no final. Seu único intuito é nos libertar do sofrimento e isto não pode ser conseguido apenas com a ajuda de nossa razão. Não obstante, há no budismo uma parte filosófica muito grande que serve para explicar a doutrina, a qual precisa ser vivida para ser realmente compreendida.

Buscamos entender tanto o que se passa conosco como fora de nós para sermos felizes, mas tudo isso é muito difícil, pois o sofrimento sempre chega de formas variadas e fora de nosso controle.
Isto ocorre porque a natureza das coisas é a impermanência.

 Felicidade e  Sofrimento

A proposta do budismo é atingir a felicidade completa e erradicar o sofrimento em todos os seres. Mas o que significa o sofrimento na doutrina budista? Sua palavra original em sânscrito é “dukkha” e não se refere apenas à nossa concepção comum de dor, englobando mais coisas como imperfeição, miséria, insatisfação, penalidade, angústia etc.

 Isto quer dizer que, quando se fala no budismo que o sofrimento é inerente à vida, não se trata de um ponto de vista pessimista, mas apenas que estas coisas ligadas à dor aparecem de forma constante e intermitente em nossa vida, ou seja, é dizer que elas existem.

No budismo, existe o conceito do despertar ou da “iluminação”. Mas por que esse nome? Buda explicou que o mundo deveria ser considerado como um sonho. Ao estarmos sonhando, vivemos aquele momento de maneira tão real quanto a vida que temos quando acordados.

Somente ao despertarmos é que podemos entender que aquilo era apenas um sonho, uma elaboração de nossa mente. Todos nós experimentamos isso ao termos um pesadelo, quando nos recordamos da sensação de alivio ao despertar e compreender que aquilo tudo não era verdadeiro. O budismo ensina que nossa vida, percebida vividamente como real, no fundo é de natureza ilusória e que é possível um “despertar” para compreendê-la.

A felicidade de que fala o budismo é algo completo. Como percebeu Buda, nenhum ser humano escapa de sofrer com a doença e a morte ao menos uma vez. Ademais, o sofrimento físico e mental se manifestam continuamente em nós. Apesar de termos como certo que somos felizes, esta felicidade é impermanente e logo desaparece.

 Diante desta condição de existência, podemos chegar à conclusão de que a felicidade é um equilíbrio entre o bem e o mal, incluindo o fato de admitirmos o mal como necessário para podermos desfrutar o bem.

Isto é uma grande verdade, mas se trata de uma felicidade condicionada, ou seja, que só existe dependendo de algumas circunstâncias externas e internas. Quando o budismo fala em sermos felizes, isso quer dizer que devemos conseguir uma felicidade incondicionada, que exista de maneira independente das circunstâncias.

Bem, mas por que nossa felicidade está sempre condicionada e não é completa? Continuamente, tentamos agir e pensar corretamente para não sofrermos. Buscamos entender tanto o que se passa conosco como fora de nós para sermos felizes, mas isso tudo é muito difícil, pois o sofrimento sempre chega de formas variadas e fora de nosso controle.

Isto ocorre porque a natureza das coisas é a impermanência, ou seja, não há nada que não esteja em constante transformação e sujeito à extinção.

Impermanência

Buda observou, portanto, que a felicidade está condicionada e, por isso, aparece de forma errante na vida humana. Entretanto, resistiu em admitir isso como explicação final e tinha uma enorme fé de que, um dia, encontraria a solução.

 Quando atingiu sua iluminação, ele encontrou o fundamento deste problema e, consequentemente, sua resposta. De forma concisa, explicou as “Quatro Nobres Verdades” e ofereceu um método para seguirmos, a fim de chegarmos aonde ele chegou.

 Este método é o “Nobre Caminho Óctuplo”, de onde parte todo o desenvolvimento da doutrina budista. Seu papel é o de nos conduzir à liberação definitiva do sofrimento e a essa felicidade incondicionada.

Ainda que as escrituras budistas, chamadas de “Cânones” (tibetano, chinês, pali etc), ocupem centenas de volumes, são como uma pirâmide, em cuja ponta estão as Quatro Nobres Verdades e o Nobre Caminho Óctuplo.

 O budismo coloca um ponto muito importante, que é a indagação da natureza de tudo o que existe, ou seio, até que ponto as coisas e nós mesmos somos o que parecemos ser. 

Agora, vejamos de que forma a impermanência nos mantém sujeitos a experimentar o sofrimento. De maneira contínua, nossa mente entra em contato com objetos, como coisas materiais, pensamentos, estados de ânimo ou algo qualquer que ela possa perceber.

 Além disso, sentimos desejo com relação a estes objetos em inúmeras ocasiões. Podemos sentir desejo, por exemplo, de que apareçam ou desapareçam, de encontrá-los ou evitá-los.

 Sendo a impermanência a natureza de tudo o que existe, nosso sofrimento sempre ocorrerá, pois não podemos controlar a natureza do que estamos percebendo. Assim, caso alguma pessoa nos agrade, queremos sua presença, mas não podemos controlar quando ela aparecerá, ocorrendo o mesmo com aquela que nos desagrada e não queremos ver.

Também não podemos impedir que os pensamentos que nos desagradam passem por nossa mente, do mesmo jeito que não podemos manter os pensamentos que nos deixam felizes por todo o tempo.

Então, poderíamos pensar que, através da eliminação do desejo, o budismo promove uma espécie de apatia, mas não é verdade. Esta também é um desejo de não encontrar objetos ou de não atuar perante eles e, como todo desejo, acarreta sofrimento.

 Se alguém é apático, ser-lhe-á impossível não entrar em relação com objetos exteriores e, menos ainda, com seus próprios pensamentos. Ver-se-á obrigado a agir, querendo ou não.

 Seríamos tolos se, diante de uma enfermidade, não quiséssemos ser curados, se preferíssemos não saltar antes de sermos atropelados ou de não evitarmos aquelas pessoas que nos fazem sofrer. O budismo também nos convoca para evitar o sofrimento não apenas em nós mesmos, mas em todos os seres.

A doutrina budista aponta algo muito mais sutil do que um mero estado passivo diante da realidade quando fala da aniquilação do desejo. Mas para entendermos este ponto, teríamos primeiro que indagar à natureza de nós mesmos e destes objetos a razão pela qual sentimos determinado desejo.

 De alguma maneira, ele existe em uma relação entre nós e aquilo que nossa mente percebe. Sendo assim, devemos perguntar antes quem somos e qual é a natureza de tudo que percebemos, pois, desta forma, poderíamos captar o que significa essa felicidade incondicional por um novo prisma.

Existência convencional e existência definitiva

O budismo coloca um ponto muito importante, que é a indagação da natureza de tudo o que existe, ou seja, até que ponto as coisas e nós mesmos somos o que parecemos ser. Segundo a doutrina, nossa natureza é ilusória, de forma similar ao que se passa nos sonhos. Isto significa que as coisas existem, mas não de forma definitiva.

Também se costuma dizer que as coisas carecem de uma existência inerente. Isso parece uma contradição até que o praticante perceba a questão por experiência própria. Por um lado, dizemos que nossa casa, nossa cidade, nossos amigos, nosso corpo ou nossos pensamentos existem de um ponto de vista convencional, mas, por outro, nada disso existe do ponto de vista definitivo
.
Bem, mas o que isso tem a ver com a explicação de sentirmos desejo sobre muitas coisas que nossas mentes percebem? Há uma existência convencional em que sentimos desejo ou aversão pelas coisas, mas há também uma existência definitiva onde nada disso está ocorrendo.

 É uma questão muito sutil. Não quer dizer que seja mentira o que vivemos, as duas visões da realidade são, na verdade, uma coisa só. É como ver uma pessoa sonhando e que começa a chorar. Então, diríamos “desperta”, mas ela está incapaz de nos ouvir. Naquele momento, ela vive essa realidade. Negar que esteja vivendo tudo isso seria um erro, pois, se ela chora, é porque está passando por uma determinada situação em seu sonho.

Realizar a compreensão da inexistência do Eu não é uma simples crença ou um questionamento puramente racional, mas uma experiência pessoal que o praticante viverá cedo ou tarde. Quando isto acontecer, ele perceberá a existência de uma felicidade incondicionada


A inexistência do Eu

Então, por que vivemos esta realidade convencional e não podemos viver a definitiva? Em nosso ser, existe algo em torno do qual giram todas as nossas percepções, pensamentos e ações.

É uma estrutura “artificial” que no nasce conosco, mas que vai surgindo de maneira progressiva, à medida em que vamos adquirindo consciência de nós mesmos, desenvolvendo a linguagem e o contato com a realidade.

É como uma espécie de programa que existe em nós e que nos situa no tempo e no espaço, oferecendo-nos um lugar na realidade em que vivemos. Essa estrutura que faz com que nos percebamos como indivíduos separados das demais coisas e seres é o “Eu”.

Os psicólogos têm se ocupado muito no estudo do Eu, pois ele é a causa principal do sofrimento nos homens. Todos nós conhecemos as palavras egocentrismo, egoísmo etc, que definem enfermidades cuja base é o Eu.

Portanto, o budismo não só propõe a felicidade aos indivíduos na sociedade, como a psicologia, mas também pretende levar o ser humano a uma felicidade incondicionada. O budismo afirma que o Eu não existe de forma definitiva, mas apenas do ponto de vista convencional.

Realizar a compreensão da inexistência do Eu não é uma simples crença ou um questionamento puramente racional, mas uma experiência pessoal que o praticante viverá cedo ou tarde.

Quando isto acontecer, ele perceberá a existência de uma felicidade incondicionada, não dependente das circunstâncias externas que estão sempre vinculadas a este Eu que ganha ou perde, odeia ou deseja etc. O praticante dar-se-á conta de que esse Eu está vazio de uma existência final.

A compaixão

No caminho, o progresso do praticante pode ser gradual ou súbito, mas, em qualquer caso, a experiência de que o Eu não possui uma existência definitiva marcará uma grande etapa.

 É aí que a compaixão surge de forma natural, visto que a experiência de constatar essa falsa individualidade, que nos faz parecer separados dos demais seres, Leva- nos a um automático sentimento de uma verdadeira compaixão e irmandade universal.

Com o tempo, essa compaixão possibilitará ao praticante entrar no caminho do boddhisatva ou daquele que renuncia a permanecer indefinidamente nesse estado de felicidade incondicionada para ajudar a todos os seres em seu despertar. O voto do boddhisatva é realizado por muitos praticantes como uma prova de boas intenções no caminho, ainda que, na verdade, o primeiro de seus dez estados ocorra de maneira natural. Em algumas escolas, esse voto se realiza antes mesmo do praticante ter atingido esta compreensão.
A existência desse voto do boddhisatva distingue o budismo Mahayana do Theravada, no qual se propõe a liberação do sofrimento sem questões adicionais.

 No entanto, a compaixão também está naturalmente presente nesta tradição. O budismo é uma árvore com várias ramificações, mas que deve ser contemplado de forma unitária. Á percepção profunda da inexistência do Eu não é, em absoluto, a definitiva iluminação budista, mas somente um ponto crucial do caminho.

 A psicologia budista distingue diferentes tipos de consciência, assim como existem níveis mais sutis de desejo que devem ser erradicados depois da percepção da inexistência do Eu.

O objetivo principal destes esclarecimentos é o de oferecer uma pequena  
Busca da Felicidade.

Qual é o caminho que o budista deve percorrer para conquistar a felicidade incondicional, resultado da compaixão por todos os seres
e da libertação final de todo sofrimento?

O budismo não vê a existência do ser humano abaixo dos desígnios de divindades e nem a necessidade de se ter fé nelas. Sem dúvida, ele também é considerado uma religião, palavra que vem de religare ou seja, “voltar a unir o que está separado”.

 O budismo afirma ser um caminho para o completo despertar espiritual do ser humano, o que nos permite supor o entendimento de que não somos algo separado da natureza fundamental que está em todas as coisas.

Ele também requer fé, ainda que não em seres superiores, mas nos ensinamentos budistas, chamados de “dharma”. Do mesmo modo que, para fazermos uma viagem, precisamos acreditar que os mapas são corretos, é necessário que se tenha fé nos ensinamentos de Buda para seguir este caminho. A fé verdadeira em que todo ser humano tem capacidade para se converter em um Buda é um sinal de completo despertar espiritual.

Buda dizia que não dava por dogma nada sobre sua doutrina ou sua pessoa. Isso significa que a fé da qual se fala no budismo não é cega, mas baseada na própria crítica pessoal, na experiência do que já foi vivido e na capacidade de indagação.

O budismo não é, tampouco, um caminho de conceitos ou leituras para se obter conclusões razoáveis no final. Seu único intuito é nos libertar do sofrimento e isto não pode ser conseguido apenas com a ajuda de nossa razão. Não obstante, há no budismo uma parte filosófica muito grande que serve para explicar a doutrina, a qual precisa ser vivida para ser realmente compreendida.

Buscamos entender tanto o que se passa conosco como fora de nós para sermos felizes, mas tudo isso é muito difícil, pois o sofrimento sempre chega de formas variadas e fora de nosso controle.
Isto ocorre porque a natureza das coisas é a impermanência.

 Felicidade e  Sofrimento

A proposta do budismo é atingir a felicidade completa e erradicar o sofrimento em todos os seres. Mas o que significa o sofrimento na doutrina budista? Sua palavra original em sânscrito é “dukkha” e não se refere apenas à nossa concepção comum de dor, englobando mais coisas como imperfeição, miséria, insatisfação, penalidade, angústia etc.

 Isto quer dizer que, quando se fala no budismo que o sofrimento é inerente à vida, não se trata de um ponto de vista pessimista, mas apenas que estas coisas ligadas à dor aparecem de forma constante e intermitente em nossa vida, ou seja, é dizer que elas existem.

No budismo, existe o conceito do despertar ou da “iluminação”. Mas por que esse nome? Buda explicou que o mundo deveria ser considerado como um sonho. Ao estarmos sonhando, vivemos aquele momento de maneira tão real quanto a vida que temos quando acordados.

Somente ao despertarmos é que podemos entender que aquilo era apenas um sonho, uma elaboração de nossa mente. Todos nós experimentamos isso ao termos um pesadelo, quando nos recordamos da sensação de alivio ao despertar e compreender que aquilo tudo não era verdadeiro. O budismo ensina que nossa vida, percebida vividamente como real, no fundo é de natureza ilusória e que é possível um “despertar” para compreendê-la.

A felicidade de que fala o budismo é algo completo. Como percebeu Buda, nenhum ser humano escapa de sofrer com a doença e a morte ao menos uma vez. Ademais, o sofrimento físico e mental se manifestam continuamente em nós. Apesar de termos como certo que somos felizes, esta felicidade é impermanente e logo desaparece.

 Diante desta condição de existência, podemos chegar à conclusão de que a felicidade é um equilíbrio entre o bem e o mal, incluindo o fato de admitirmos o mal como necessário para podermos desfrutar o bem.

Isto é uma grande verdade, mas se trata de uma felicidade condicionada, ou seja, que só existe dependendo de algumas circunstâncias externas e internas. Quando o budismo fala em sermos felizes, isso quer dizer que devemos conseguir uma felicidade incondicionada, que exista de maneira independente das circunstâncias.

Bem, mas por que nossa felicidade está sempre condicionada e não é completa? Continuamente, tentamos agir e pensar corretamente para não sofrermos. Buscamos entender tanto o que se passa conosco como fora de nós para sermos felizes, mas isso tudo é muito difícil, pois o sofrimento sempre chega de formas variadas e fora de nosso controle.

Isto ocorre porque a natureza das coisas é a impermanência, ou seja, não há nada que não esteja em constante transformação e sujeito à extinção.

Impermanência

Buda observou, portanto, que a felicidade está condicionada e, por isso, aparece de forma errante na vida humana. Entretanto, resistiu em admitir isso como explicação final e tinha uma enorme fé de que, um dia, encontraria a solução.

 Quando atingiu sua iluminação, ele encontrou o fundamento deste problema e, consequentemente, sua resposta. De forma concisa, explicou as “Quatro Nobres Verdades” e ofereceu um método para seguirmos, a fim de chegarmos aonde ele chegou.

 Este método é o “Nobre Caminho Óctuplo”, de onde parte todo o desenvolvimento da doutrina budista. Seu papel é o de nos conduzir à liberação definitiva do sofrimento e a essa felicidade incondicionada.

Ainda que as escrituras budistas, chamadas de “Cânones” (tibetano, chinês, pali etc), ocupem centenas de volumes, são como uma pirâmide, em cuja ponta estão as Quatro Nobres Verdades e o Nobre Caminho Óctuplo.

 O budismo coloca um ponto muito importante, que é a indagação da natureza de tudo o que existe, ou seio, até que ponto as coisas e nós mesmos somos o que parecemos ser.


Agora, vejamos de que forma a impermanência nos mantém sujeitos a experimentar o sofrimento. De maneira contínua, nossa mente entra em contato com objetos, como coisas materiais, pensamentos, estados de ânimo ou algo qualquer que ela possa perceber.

 Além disso, sentimos desejo com relação a estes objetos em inúmeras ocasiões. Podemos sentir desejo, por exemplo, de que apareçam ou desapareçam, de encontrá-los ou evitá-los.

 Sendo a impermanência a natureza de tudo o que existe, nosso sofrimento sempre ocorrerá, pois não podemos controlar a natureza do que estamos percebendo. Assim, caso alguma pessoa nos agrade, queremos sua presença, mas não podemos controlar quando ela aparecerá, ocorrendo o mesmo com aquela que nos desagrada e não queremos ver.

Também não podemos impedir que os pensamentos que nos desagradam passem por nossa mente, do mesmo jeito que não podemos manter os pensamentos que nos deixam felizes por todo o tempo.

Então, poderíamos pensar que, através da eliminação do desejo, o budismo promove uma espécie de apatia, mas não é verdade. Esta também é um desejo de não encontrar objetos ou de não atuar perante eles e, como todo desejo, acarreta sofrimento.

 Se alguém é apático, ser-lhe-á impossível não entrar em relação com objetos exteriores e, menos ainda, com seus próprios pensamentos. Ver-se-á obrigado a agir, querendo ou não.

 Seríamos tolos se, diante de uma enfermidade, não quiséssemos ser curados, se preferíssemos não saltar antes de sermos atropelados ou de não evitarmos aquelas pessoas que nos fazem sofrer. O budismo também nos convoca para evitar o sofrimento não apenas em nós mesmos, mas em todos os seres.

A doutrina budista aponta algo muito mais sutil do que um mero estado passivo diante da realidade quando fala da aniquilação do desejo. Mas para entendermos este ponto, teríamos primeiro que indagar à natureza de nós mesmos e destes objetos a razão pela qual sentimos determinado desejo.

 De alguma maneira, ele existe em uma relação entre nós e aquilo que nossa mente percebe. Sendo assim, devemos perguntar antes quem somos e qual é a natureza de tudo que percebemos, pois, desta forma, poderíamos captar o que significa essa felicidade incondicional por um novo prisma.

Existência convencional e existência definitiva

O budismo coloca um ponto muito importante, que é a indagação da natureza de tudo o que existe, ou seja, até que ponto as coisas e nós mesmos somos o que parecemos ser. Segundo a doutrina, nossa natureza é ilusória, de forma similar ao que se passa nos sonhos. Isto significa que as coisas existem, mas não de forma definitiva.

Também se costuma dizer que as coisas carecem de uma existência inerente. Isso parece uma contradição até que o praticante perceba a questão por experiência própria. Por um lado, dizemos que nossa casa, nossa cidade, nossos amigos, nosso corpo ou nossos pensamentos existem de um ponto de vista convencional, mas, por outro, nada disso existe do ponto de vista definitivo
.
Bem, mas o que isso tem a ver com a explicação de sentirmos desejo sobre muitas coisas que nossas mentes percebem? Há uma existência convencional em que sentimos desejo ou aversão pelas coisas, mas há também uma existência definitiva onde nada disso está ocorrendo.

 É uma questão muito sutil. Não quer dizer que seja mentira o que vivemos, as duas visões da realidade são, na verdade, uma coisa só. É como ver uma pessoa sonhando e que começa a chorar. Então, diríamos “desperta”, mas ela está incapaz de nos ouvir. Naquele momento, ela vive essa realidade. Negar que esteja vivendo tudo isso seria um erro, pois, se ela chora, é porque está passando por uma determinada situação em seu sonho.

Realizar a compreensão da inexistência do Eu não é uma simples crença ou um questionamento puramente racional, mas uma experiência pessoal que o praticante viverá cedo ou tarde. Quando isto acontecer, ele perceberá a existência de uma felicidade incondicionada


A inexistência do Eu

Então, por que vivemos esta realidade convencional e não podemos viver a definitiva? Em nosso ser, existe algo em torno do qual giram todas as nossas percepções, pensamentos e ações.

É uma estrutura “artificial” que no nasce conosco, mas que vai surgindo de maneira progressiva, à medida em que vamos adquirindo consciência de nós mesmos, desenvolvendo a linguagem e o contato com a realidade.

É como uma espécie de programa que existe em nós e que nos situa no tempo e no espaço, oferecendo-nos um lugar na realidade em que vivemos. Essa estrutura que faz com que nos percebamos como indivíduos separados das demais coisas e seres é o “Eu”.

Os psicólogos têm se ocupado muito no estudo do Eu, pois ele é a causa principal do sofrimento nos homens. Todos nós conhecemos as palavras egocentrismo, egoísmo etc, que definem enfermidades cuja base é o Eu.

Portanto, o budismo não só propõe a felicidade aos indivíduos na sociedade, como a psicologia, mas também pretende levar o ser humano a uma felicidade incondicionada. O budismo afirma que o Eu não existe de forma definitiva, mas apenas do ponto de vista convencional.

Realizar a compreensão da inexistência do Eu não é uma simples crença ou um questionamento puramente racional, mas uma experiência pessoal que o praticante viverá cedo ou tarde.

Quando isto acontecer, ele perceberá a existência de uma felicidade incondicionada, não dependente das circunstâncias externas que estão sempre vinculadas a este Eu que ganha ou perde, odeia ou deseja etc. O praticante dar-se-á conta de que esse Eu está vazio de uma existência final.

A compaixão

No caminho, o progresso do praticante pode ser gradual ou súbito, mas, em qualquer caso, a experiência de que o Eu não possui uma existência definitiva marcará uma grande etapa.

 É aí que a compaixão surge de forma natural, visto que a experiência de constatar essa falsa individualidade, que nos faz parecer separados dos demais seres, Leva- nos a um automático sentimento de uma verdadeira compaixão e irmandade universal.

Com o tempo, essa compaixão possibilitará ao praticante entrar no caminho do boddhisatva ou daquele que renuncia a permanecer indefinidamente nesse estado de felicidade incondicionada para ajudar a todos os seres em seu despertar. O voto do boddhisatva é realizado por muitos praticantes como uma prova de boas intenções no caminho, ainda que, na verdade, o primeiro de seus dez estados ocorra de maneira natural. Em algumas escolas, esse voto se realiza antes mesmo do praticante ter atingido esta compreensão.
A existência desse voto do boddhisatva distingue o budismo Mahayana do Theravada, no qual se propõe a liberação do sofrimento sem questões adicionais.

 No entanto, a compaixão também está naturalmente presente nesta tradição. O budismo é uma árvore com várias ramificações, mas que deve ser contemplado de forma unitária. Á percepção profunda da inexistência do Eu não é, em absoluto, a definitiva iluminação budista, mas somente um ponto crucial do caminho.

 A psicologia budista distingue diferentes tipos de consciência, assim como existem níveis mais sutis de desejo que devem ser erradicados depois da percepção da inexistência do Eu.

O objetivo principal destes esclarecimentos é o de oferecer uma pequena idéia de como o budismo encara a prática da compreensão da realidade e de nós mesmos.

Revista Budismos  da Editora  Escala Victor Rebelo, Editor de "Como o budismo encara a prática da compreensão da realidade e de nós mesmos".

Revista Budismos  da Editora  Escala Victor Rebeleo, Editor 

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